Ao Alex, Breno, Cesar, Danilo e Léo,
meus queridos ex-alunos que já cresceram.
A
chuva caia a cântaros na rua, a Avenida Paulista estava colorida com os faróis
dos carros brilhando, guarda-chuvas de todas as cores possíveis passeavam
atravessando a rua, risadas sonoras e alegres infestavam toda a extensão da
Avenida, do Paraíso até a Consolação. Aquela noite de sábado, apesar da chuva,
parecia ser uma das mais felizes que a cidade já presenciara. Os sons das
conversas animadas em frente a Casa das Rosas, um bebê nascendo no Santa
Catarina, alguém contando sobre um novo livro que havia lido no Fran’s Café.
Aparentemente o coração das pessoas estava cheio de alegria, de todos os tipos.
Descendo
a Rua 13 de Maio, no bairro da Bela Vista, um grupo de cinco amigos adolescentes se encontravam. Eles subiam a rua conversando alto e dando risada, cada um com
uma long neck na mão. Não estavam se
importando com a chuva que caía. Eles eram meninos perdidos, perdidos no mundo,
perdidos na vida. Todos perdidos da melhor maneira que poderiam estar. O mundo
estava girando, e eles não se preocupavam. A vida estava apenas começando e
tudo o que eles esperavam dela era pura diversão.
Na
esquina da Paulista com a 13 de Maio havia uma praça, ali era seu Quartel
General de todas as noites de fim de semana. Ali eles se sentavam, e ali aquela
amizade crescia. Eles sabiam que quando a escola terminasse seria cada um por
si e as coisas iriam ser mais difíceis, mas não queriam pensar nisso agora.
Ainda tinham algumas semanas para serem adolescentes inconsequentes. Tinham
mais duas semanas para se perderem.
-A
gente precisa fazer uma coisa inesquecível essa noite. – disse Carlos já
alterado.
-Vamos
arrumar umas minas, e aí... – começou Daniel, mas logo foi interrompido.
-Que
minas, mano! Temos que fazer alguma coisa louca. – disse Lucas parecendo mais
animado que os outros.
-Alguma
coisa louca tipo o que? – perguntou André parecendo interessado.
-Vocês
estão querendo encrenca aqui... – alertou Bernardo, mas com um tom de
brincadeira na voz.
-Vamos
roubar um carro. – disse Carlos calmamente.
-Quê?
– os outros quatro estavam realmente surpresos com a ideia do amigo.
-É,
roubar um carro. A gente quer ou não que essa porra seja inesquecível? – Carlos
estava decidido já se levantando.
-Carlos,
como nós vamos roubar um carro, mano? Você enlouqueceu? – dizia André perplexo.
-Espera,
espera, espera. – interrompeu Lucas mais uma vez. – Você tem algum plano?
-Lucas,
você não pode estar falando sério. Você tá levando ele a sério? – Daniel ergueu
um pouco a voz.
-Por
que não? – disse ele calmo.
-Porque
isso é crime! – rebateu Bernardo.
-Mas
nós não vamos ficar com o carro pra gente... É só dar uma volta e devolver onde
encontramos. – disse Carlos.
-E
quem aqui sabe dirigir nessa porra? – disse André já nervoso.
-A
gente consegue enganar... – respondeu Daniel rindo.
-E
aí, vamos? – disse Lucas também se levantando.
-Vamos
nessa... – disse Carlos.
Os
outros três se olharam desconfiados imaginando a loucura que estavam para
cometer, mas mesmo assim aceitaram.
Trinta
minutos depois os cinco estavam de volta à Bela Vista, andavam pela 13 de Maio
até avistarem um rapaz guardando uma chave de carro.
-Acho
que é mais fácil roubar a chave do que o carro, não? – perguntou Carlos.
-Talvez...
Mas quem vai roubar o cara? – perguntou Lucas nervoso. Eles se olharam ainda
mais nervosos.
-Ah,
foda-se! Eu vou. – disse Carlos por fim. Ele saiu atrás do rapaz sem dizer mais
nada, virou a próxima rua e sumiu dos olhos dos outros. Cerca de quatro minutos
depois ele voltou segurando a chave.
-Eu
não acredito. – disse Bernardo atônito.
-Você
roubou a chave, mas e o carro? – perguntou Danilo.
-Ele
me disse onde está, eu ameacei matar. – disse Carlos.
-Mano,
vocês são doidos. – disse André.
-Você
também está aqui, André. Fica suave. – disse Lucas.
-Vamos?
– perguntou Carlos sorrindo.
-Antes
que eu perca a coragem... – disse Bernardo.
Eles
foram até a Rui Barbosa, ali estava estacionado um Prisma, eles pararam em
volta e Carlos anunciou:
-É
esse.
-Quem
dirige? – perguntou Daniel.
-Eu
vou. – disse Carlos.
-Você
realmente é doido, mano. – disse André rindo.
Os
cinco entraram no carro, Carlos deu a partida meio desengonçado e saiu em
direção a Avenida Paulista deixando o carro morrer uma ou duas vezes no
caminho, o que foi motivo de riso entre os outros. Eles iam a toda velocidade
que podiam pela Avenida, viam as luzes do prédio da FIESP se aproximando, a
música muito alta, tocava Charlie Brown do
Coldplay enquanto os cinco riam de
toda a situação sem se preocupar com o que aconteceria em seguida. Ao fazerem o
retorno, e Carlos aprender a trocar a marcha um pouco melhor, eles decidiram
que o certo a se fazer era estacionar o carro de volta onde encontraram e
deixar a chave escondida na roda. Foi o que fizeram, eles escreveram um bilhete
numa nota fiscal que estava no bolso de Bernardo, com a caneta na mochila de
Carlos e ele dizia: “Obrigado!”. Eles deixaram no para-brisas e saíram andando
enquanto riam e o relógio marcava três da madrugada.
Carlos
foi o último a chegar em casa, mas antes passou no Estadão, tinha mais uma
coisa a fazer naquela noite. Ali sentado no balcão com uma cerveja ao lado,
estava Douglas, o rapaz de quem ele havia emprestado a chave. Carlos ergueu a
mão e devolveu a Douglas sorrindo. Ele havia fingido colocar a chave na roda.
-Obrigado,
cara. Foi muito legal. – disse Carlos sorrindo.
-O
carro está inteiro? – perguntou ele preocupado.
-Completamente.
-E
vocês se divertiram? – Douglas sorria.
-De
mais, como nunca.
-Então
valeu a pena. Boa noite, Carlos.
-Boa
noite, professor.
A
chuva continuava a cair lá fora, o centro da cidade parecia ainda mais bonito
com aquele tempo, pensou Douglas enquanto parava um táxi na rua deserta. Ao
chegar em seu próprio carro, ele sorriu com o bilhete, o pegou e dobrou com
carinho guardando-o no bolso. Era ele que jamais se esqueceria o que aqueles
meninos representaram em sua vida.
Lindo cara
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