Em 2011 conheci Judith Butler, uma
filósofa norte-americana que me deu um caminho sobre o que eu sempre quis
falar: identidade de gênero. Eu não tinha o embasamento teórico e nem histórico
para discutir o assunto até então. Desde então, venho escrevendo sobre o
assunto e debatendo-o com amigos, nas redes sociais e em sala de aula de forma
quase incansável. Mas uma autorreflexão me leva a questionar de onde veio essa
vontade. Claro, é impossível falar sobre o assunto sem falar sobre a condição
feminina no mundo, sobre o feminismo, sobre o binarismo estabelecido pela
sociedade, sobre o machismo. Tudo isso está num espectro só.
O fato de eu ter sido criado por duas
mulheres – minha mãe e minha irmã – e que minha família é basicamente
constituída de mulheres que foram muito fortes para suas épocas, certamente foi
fator determinante para o meu interesse no assunto. Há centenas de filósofos,
sociólogos, jornalistas, historiadores, atrizes de Hollywood (Patricia Arquette
e seu discurso sem igual!) e os economistas (porque os economistas,
principalmente de certas publicações, sabem de tudo), mas acredito que ninguém
jamais tenha falado de tal assunto de forma tão leve e tão divertida quanto as Spice Girls. Sim, a girlband britânica que foi um sucesso estrondoso no final dos anos
de 1990.
Quando as apimentadas lançaram seu
primeiro hit, Wannabe, eu tinha quase
cinco anos de idade, o que significa que minha irmã deveria ter acabado de
completar doze anos, portanto, uma pré-adolescente. Uma pré-adolescente que foi
tomada pela Spice Fever, lembro-me
muito claramente da fita tocando sem parar a tarde inteira, lembro também da
Rede Globo anunciando um inédito show ao vivo das meninas em Istambul, lembro
da camiseta com a capa do primeiro álbum, lembro-me
de ir assistir ao filme (ele não é tão ruim assim...) Spiceworld nas estreia e dublado. Pra mim, as Spice Girls eram um festival de cores e de danças animadas, com o
lançamento do clipe de Viva Forever(aquele das fadinhas) em 1998, o trabalho delas estava completo para comigo: eu
era um fã. Isso faz quase vinte anos, eu continuo sendo. Me emocionei nas
Olimpíadas, fiquei frustrado quando elas cancelaram o show da Argentina em 2007
(eu ia!).
Mas foi apenas depois de mais velho
que percebi como aquele feminismo era gostoso. É inegável, elas eram produtos
de uma mídia que queria lucrar, elas eram o pós-Madonna e nunca chegaram ao
nível social que a própria Madonna ou até Lady Gaga atingiram, mas elas
conseguiram algo muito mais interessante e confortável. Um nome gigantesco
calcado na diversão. Falar de assuntos sérios como o uso de preservativos – vai
dizer que você não sabia que 2 Become 1
era sobre isso? -, o preço da fama (WhoDo You Think You Are?), falaram sobre o adeus que acaba vindo (Goodbye) e até sobre relações obsessivas
(Too Much), mas, sobretudo, elas
falaram sobre a amizade e a cumplicidade (Wannabe
e Headlines) que são as
ferramentas essenciais para que qualquer reivindicação possa se realizar. No
limite, qualquer tipo de ato político deve começar com um desejo, uma conversa,
uma vontade de algo.
Acredito hoje que o fenômeno Spice tenha sido mais importante do que
a própria Madonna no decorrer dos anos 2000, vamos encarar a realidade: Quem
seriam as Destiny’s Child sem as
cinco britânicas antes? Haveria letras de contestação do lugar da mulher na
sociedade (Can’t Hold Us Down de
Christina Aguilera) se não fossem antes as canções divertidas das Spice Girls?
Aos quase vinte e quatro anos,
encaminhado na vida, com uma formação política acima da média e sendo eu um
formador de opiniões, sinto vontade de retornar a essa coisa mais tranquila e
sossegada que essas meninas representaram por algum tempo. Quem sabe a epígrafe
do mestrado não acabe sendo algo como “Zig-Zig-Ah”?
Acho que seria no mínimo interessante. Diante de toda a pressão que estamos
vivendo ultimamente, um retorno àquilo que é pacífico se faz mais do que uma
boa pedida. Voltemos ao bom e velho girl power
onde tudo começou.
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