sexta-feira, 26 de junho de 2015

"Out of the Woods"



Em homenagem aos que amam, independente do sexo ou identidade de gênero! #LoveWins

Aos que já se perderam tantas vezes nas florestas escuras: há sempre uma saída.

O som do riso de João ecoou por todo o prédio, ele percebeu que havia rido alto de mais, o que fez com que ele risse mais ainda. Marcos o acompanhou no riso. A noite estava apenas começando e eles já estavam bêbados o suficiente para não precisarem de mais nenhuma gota de álcool, mas quando se está bêbado, essas coisas não importam muito. No notebook parado na mesa de centro uma chamada de vídeo tocava: Bruno. Eles atenderam e logo visualizaram o amigo: negro, com os cabelos crespos e um sorriso que iluminava qualquer quarto escuro de tão brancos eram seus dentes.

-Vocês estão bêbados? – perguntou Bruno sorrindo na tela.
-Só um pouco, Bruninho... Dá pra notar? – perguntou Marcos rindo e falando bem mais alto que o normal.
-Tá na cara de vocês. – disse Bruno da forma mais simpática que pôde, mas ainda com uma entonação de quem queria dizer que eles estavam errados.
-Vem pra cá, Bruno! Corre que ainda tem bebida! – disse João pulando em frente ao computador.
-Acho que vou passar, meninos. Eu só liguei pra saber se vocês queriam sair pra comer alguma coisa, mas parece que vocês já passaram da fase de comer. A gente se fala amanhã...
-Beijos, negão lindo! – disse Marcos mandando um beijo no ar.
-Juízo vocês dois. – foi o que Bruno disse antes de desligar. Ele estava certo em recomendar algo assim aos dois.
-Vamos dançar! – a ideia surgiu na mente de João como se fosse a maior descoberta de toda a sua vida. Ele procurou uma pasta no computador, clicou duas vezes e a música começou a tocar.
-Rápido! Vamos tirar os móveis pra gente poder dançar! – o tom de Marcos era um tom de pura urgência.



E eles dançaram, dançaram como se aquela música fosse a única que existia no mundo, foi como se tudo ao redor deles fosse feito de música, como se o resto do mundo fosse preto e branco e apenas aquele momento tivesse cores, foi como se eles tivessem o peso de dois aviões de papel voando pelo ar, como se em algum momento muito distante deles, o mundo tivesse sido criado por música. E tudo levava àquilo: os dois dançando na sala de estar do apartamento de João, a música alta. Os vizinhos deviam estar incomodados, mas nenhum deles ligava, eles queriam apenas dançar. E eles dançaram ao que pareceram horas, quando, na verdade, foram apenas alguns poucos minutos. A música terminou e eles se jogaram no sofá.

-Espera aí... – disse João se levantando e indo até o quarto. Voltou segurando uma antiga máquina Polaroid na mão. – Vamos tirar uma selfie.
-Com uma Polaroid? – perguntou Marcos achando graça naquilo tudo.
-Diga x!

O flash saiu e cegou Marcos por alguns instantes, a foto saiu com um ar de envelhecida e a borda branca ao seu redor.

-Me sinto nos anos 90. – disse Marcos rindo da cara que havia feito na foto.
-Está sensacional.
João se levantou e colocou num painel que ficava encima do sofá, admirou a foto por alguns instantes e depois disse com ar de descoberta mais uma vez:
-Vamos sair.



Eles pegaram a chave do carro e saíram para a noite quente de Dezembro. João acelerou e eles viam as luzes passando pelas janelas do carro como se fossem estrelas-cadente que não paravam de descer à terra. Eles eram duas estrelas, tinham plena consciência de que nasceram para brilhar, nasceram para ser muito mais do que os outros acreditavam que eles eram. Muito mais do que o simples barman que Marcos era, e, sem dúvidas, muito mais que o desconhecido contador no qual João se tornara. Eles não viram o que era, mas João pisou nos freios depressa de mais, os dois corpos foram jogados para frente e refletidos de volta para trás. Não havia nada na rua, apenas os postes e eles estavam longe.

-Caralho! O que foi isso João?! – todo o efeito do álcool havia desaparecido. Ele olhou para o lado, João estava com um ferimento na cabeça e ele sangrava. – Merda! Sai daí! João! Vem pra esse banco! Vai logo!

Marcos acelerou para o hospital mais próximo. Ele entrou no pronto-socorro apinhado de gente, pessoas chorando, crianças tossindo. Ele se lembrou como odiava hospitais desde criança, ao invés de curar, eles pareciam deixá-lo três vezes mais doente. João estava apoiado ao seu lado meio tonto. Uma enfermeira correu para atendê-los.

-O que houve? – perguntou ela friamente.
-Um acidente de carro. – Marcos respondeu.
-Mais alguém ferido? – o tom frio dela começou a irritar Marcos.
-Não, só ele.
-Preciso que você preencha uns papéis na recepção, nós vamos levá-lo pra dentro.
-Eu quero ir junto.
-Você é parente?
-Não...
-Vá preencher os papeis! – ela disse pedindo ajuda de mais duas enfermeiras que colocaram João na maca e o levaram para dentro num frenesi.



Marcos foi à recepção e começou a preencher os papeis, ele não queria fazer aquilo, nada daquilo fazia sentido. Absolutamente nada. Ele queria ficar ao lado de João, queria estar lá quando ele acordasse. O que era aquilo? Quem eram eles? Talvez ele fosse apenas um fardo para João. Sua constante rebeldia, quase trinta anos e ainda agia como um adolescente. Ele estava perdido em alguma floresta escura da qual não conseguia mais sair, não havia saída, ele não conseguia chegar na clareira para que pudesse respirar. Era uma enorme mata fechada. Ele queria gritar e não conseguia. Terminou de preencher os papeis e discretamente entrou no corredor onde as enfermeiras haviam levado João e foi procurando quarto por quarto, quando finalmente o encontrou, percebeu que ele estava deitado e haviam feito pontos em sua cabeça. Ele se aproximou da cama  e pegou na mão do outro, ele abriu os olhos e o olhou sorrindo.



-Você tá bem? – perguntou João como se nada tivesse acontecido com ele próprio.
-Você está bem? – Marcos perguntou ignorando a outra pergunta.
-Claro... Vou viver. Eles fizeram vinte pontos e... – ele não falou mais, começou a chorar de uma forma quase descontrolada. Marcos não conseguiu ter outra reação a não ser chorar junto. O médico entrou no quarto frio e disse que João estava liberado, pediu que ele assinasse alguns documentos.
-Tome esses remédios, você vai sentir uma dor de cabeça forte nas próximas horas, mas nada de mais. – disse o médico entregando uma receita para João. – Você pode levá-lo para casa, ele não pode dirigir pelas próximas quarenta e oito horas.

Os dois saíram, o sol estava nascendo e João estava olhando para Marcos do banco do passageiro. Ainda havia lágrimas em seus olhos.

-Eu tenho que te libertar... – disse Marcos olhando para o volante.
João não disse nada.
-Eu preciso me descobrir.
-Nós já saímos da floresta? – perguntou João num tom sombrio. – Nós já estamos na clareira?
-Oi? – Marcos parecia confuso.
-Eu quero ficar com você. Nós já saímos? O sol está nascendo.
Marcos sorriu e olhou para João que o olhava enquanto o sol nascia.
-Nós estamos na clareira? – perguntou ele. João fez que sim com a cabeça. – Bom.




English version is coming later today! BEHOLD!

quinta-feira, 25 de junho de 2015

"How You Get The Girl"




Aos que buscam, encontram e não deixam escapar.

-Cara, relaxa. Você está parecendo um daqueles doidos andando de um lado pro outro sem parar.

Daniel estava largado no sofá segurando uma cerveja enquanto André andava no meio da sala de um lado pro outro tentando ensaiar alguma fala.

-Eu to com medo. E se ela não quiser? E se ela me disser que não, Dan? O que eu faço?
-Você segue a vida. – disse Daniel calmo.
-E se a Silvia te der o fora? – perguntou André lançando um olhar quase fulminante ao amigo.
-Ela não faria isso... Ela me ama.
-Você ama ela.
-É recíproco, assim como é com você e a Jéssica. Fica tranquilo.
-Eu não sei o que fazer, não sei o que dizer.

André fechou os olhos e viu Jéssica em sua mente, a figura perfeita da mulher que sempre esperou para si. Seus cabelos longos e pretos, seus olhos castanhos, a pele branca e os lábios vermelhos, aquele sorriso que o paralisava todas as vezes, sem falhar nenhuma vez. Ele tremeu.

-Beleza. Eu vou te ajudar. – declarou Daniel levantando-se do sofá e colocando a cerveja na mesa de centro. – Primeira coisa: arruma essa postura.

André arrumou a postura.

-Agora, você precisa ter uma entonação mais máscula na sua voz, não essa quebradinha que às vezes você dá...
-Quebradinha? Que quebradinha? – ele pareceu confuso e meio assustado. Que quebradinha?
-Você vai olhar no fundo dos olhos dela e vai... – a porta abriu, Silvia entrou no apartamento sorrindo.
-Vocês estão fazendo o que? – perguntou ela curiosa.
-Treinando. Vou continuar, amor. Então, mano... Você vai olhar no fundo dos olhos dela e vai dizer: “Você é minha, gata”. – Silvia soltou uma grande gargalhada.
-E aí ela vai virar um tapa enorme na sua cara, André. – disse ela ainda rindo.
-Você não virou na minha. – rebateu Daniel se sentindo ofendido.
-Porque você nunca me disse isso, Dan.
-Silvia... Me dá uma ajuda. – implorou André.
-Você ama ela? – perguntou Silvia sorrindo.
-Amo.
-Você está esperando tempo de mais pra dizer isso? A hora certa?
-Sim.
-É a hora certa?
-Eu acho que sim...
-Cai fora daqui e vai dizer pra ela como você se sente.

André pegou o casaco e saiu sem dizer nada. Daniel ficou parado olhando a namorada que pendurava o casaco e a bolsa no mesmo cabide.

-Você é bem direta, não? – perguntou ele com aquele sorriso de canto que Silvia adorava.

-Alguém precisa ser, não? – sorriu ela.

Daniel a abraçou e a beijou.

Estava chovendo a cântaros, ele não tinha um guarda-chuva e aparentemente nenhum táxi queria parar para ele. O celular tocou, ele viu a foto de Andréia, sua irmã, na tela e deslizou pensando em ligar depois. Logo depois uma mensagem dela chegou, dizia: “Léo e Bruno terminaram, me liga assim que puder”. Seu estômago revirou, ele tentou ignorar. Tinha que ignorar pelo menos por agora, depois ajudaria seu amigo. Um táxi parou. Ele entrou e disse o endereço de Jéssica que já sabia de cabeça.

-Vai visitar a garota, senhor? – perguntou o taxista simpático com um sotaque carregado que fez André sorrir. Adorava aquele sotaque.
-Isso, vou sim. – respondeu ele sorrindo.
-Vai pedir a moça em casamento, é?
-Ainda não! Só vou pedir em namoro... – ele disse aquilo pela primeira vez e sua ansiedade multiplicou.
-Ah! Essa parte é a mais gostosa. O senhor sabe... Estou casado com a minha esposa já faz quase vinte anos...
-É mesmo?
-Sim, e ainda me lembro de quando fui atrás dela pra dizer que tava apaixonado. Tava chovendo assim que nem hoje.
-E deu tudo certo?
-Às mil maravilhas. Chegamos, senhor.
O estômago de André revirou e ele congelou no carro.
-Boa sorte e a corrida é por minha conta hoje.
-Tem certeza?
-Absoluta. Vai lá!



Ele saiu do carro, passou o pequeno portão de ferro e bateu na porta. Ela abriu e o viu completamente molhado.

-Você enlouqueceu? – perguntou ela rindo.
-Jé... A gente junto faz seis meses e...
-André, entra. – ela disse sem prestar muita atenção. Ele obedeceu. – Tira esse casaco molhado. Eu vou pegar uma toalha e depois fazer um chocolate quente pra você e...
-Espera. – ele a puxou pelo braço. – Eu preciso falar logo.
-O que foi? – Jéssica parecia preocupada.
-Só me escuta. Eu quero você. Nos momentos bons ou ruins, como agora que podia ter um aquário dentro dos meus tênis, eu sei que em algum momento eu te magoei, mas eu prometo que eu vou arrumar o que eu fiz. Eu quero que seja como sempre foi, no começo, com as nossas fotos com beijos nas bochechas um do outro. E se você não quiser... Não tem problema. Eu vou te esperar pra sempre. Eu te amo.

Ela ficou olhando para André parado ali, tremendo de frio, completamente molhado, riu quando ele falou do aquário nos tênis, pensou que ela poderia ficar com ele num aquário para sempre, privada de toda e qualquer liberdade que isso jamais importaria. Contanto que estivesse com ele, tudo estaria bem. Tudo ficaria bem para sempre. Ela sabia que aquele era o começo de alguma coisa que não tinha prazo pra terminar, sabia que era assim, era assim que ela queria. Foi assim que ela sempre sonhou. Sempre sonhou. Ela simplesmente o abraçou e os dois se beijaram. Era o dia um de quantos dias, eles não sabiam.





English:
To those who search, find and don't let it go.


“Dude, relax. You look one of those crazy people walking around all the time”.

Daniel was laying down on the sofa holding a beer, Andy walked in the middle of the living room, from one side to another, trying to rehearse something.

“I’m terrified. What if she doesn’t want it? What if she says no to me, Dan? What do I do then?”
“You follow with your life”
“What if Silvia had dumped you?” asked Andy looking at him like he wanted to kill him.
“She wouldn’t… She loves me”
“You love her”
“There is reciprocity, as there is with Jessica and you. Be cool”
“I don’t know what to do, I don’t know what to say”

Andy closed his eyes and saw Jessica inside his mind, perfect picture of the woman he has always dreamt of. Her long black hair, her brown eyes, the white skin and her red lips putting together that smile that used to paralyze him every single time with no fail. He shivered.

“All right. I’ll help you” said Daniel standing up and putting the beer on the center table. “First things first: straight up this posture”
He straightened up his posture.
“Now, you need to impose your voice on a more masculine way, not this female thing you do sometimes…”
“Female thing? What female thing?” he seemed confused and scared. What female thing?
“You’ll look deep inside her eyes and…” the door opened, Silvia came into the apartment smiling.
“What are you guys doing?” she asked sounding curious.
“Rehearsing. I’ll go on, baby. So, man… You will look deep inside her eyes and you’ll say: ‘you are my babe’” Silvia laughed out loud.
“Then she slaps you right in your face, Andy” she said still laughing.
“You didn’t slap my face” Daniel said back sounding offended
“Because you never said that to me, Dan”
“Silvia… Help me out here” bagged Andy
“Do you love her?” asked Silvia smiling.
“I do”
“Are you waiting for a long time to tell her that? The right time?”
“Yes”
“Is this the right time?”
“I think so…”
“Get the hell out of here and go tell her how you feel”

Andy took his coat and left without a word. Daniel stood there gazing at his girlfriend hanging her purse and coat on the hanger.

“You go straight to the point, don’t you?” he asked with that side smile that Silvia loved so much.
“Someone needs to be, right?” she smiled getting closer to him.

Daniel hugged and kissed her.

It was pouring rain, Andy didn’t have an umbrella and apparently no taxi would want to stop for him. His phone ringed, he saw Andrea’s picture on the screen, he declined the call and promised call his sister back later. On the very next minute he received a text from her: “Leo and Bruno broke up, call me as soon as you can”. His stomach twisted inside, he tried to ignore it. He had to, at least for now, afterwards he would help his friend on the best way possible. A cab stopped. He went in and said Jessica’s address which he knew by heart.

“Goin’ to visit the missy, sir?” asked the driver with a very strong accent that made Andy smile, he loved that accent.
“Yes, I’m going”
“Will ya ask her to marry ya, won’t ya?”
“Not yet! I’m just going to ask her to be my girlfriend…” he said that for the first time and his anxiety went to very high levels.
“Oh! This is the best part, isn’t it? Ya know, sir… I’m married with my missy for twenty years…”
“Really?”
“Ya, and I still remember when I went for her to say I loved her. It was raining like today” he gazed into the rain for a moment.
“And everything went right?”
“Like turkey on thanks giving. We’re here, sir”
Andy froze inside the car.
“Good luck and run is on me today!”
“Are you sure?”
“Ya! Go for it, kid!”

He went down the car and passed the little iron gate, then knocked at the door. Jessica opened it up and saw him wet from head to toe.

“Are you insane?” she asked laughing
“J… We’ve been together for six months and…”
“Andy, get in” she said not paying much attention to what he was saying. He obeyed. “Get this wet coat off. I’ll get you a toil and then make you a hot chocolate and…”
“Wait” he pulled her from the arm “I need to speak now”
“What is it?” she sounded worried.
“Just listen to me. I want you for worse or for better, like right now that I could have an aquarium down inside my sneakers. I know that if at some point I broke your heart, I’ll put it back together. I want it to be how it used to be, pictures in frames of kisses on cheeks and you saying you want me. And if you don’t want to… I’ll wait you forever and ever. I love you”

She stood there looking at Andy standing in front of her, shaking, cold, completely wet, laughed when he talked about the aquarium inside his sneakers, thought that that wasn’t such a bad idea if she could stay stuck inside an aquarium as long as if they were together, then everything would be ok. Everything would be ok forever. She knew that that was the start of something they didn’t know when was going to end, she knew it was like that, that was the way she wanted. That’s how she always dreamt. She always dreamt of that. Then, Jessica just hugged him and they kissed. It was day one of the rest of their lives.



PS: Não achei um vídeo no YouTube com a música na versão original;
PS: I haven't found a video on YouTube with the  original version.


quarta-feira, 24 de junho de 2015

"Clean"


Parte do "The Taylor Swift, 1989 Project: Love Stories"



Aos que já me fizeram chão, passei pela chuva e hoje sou sol.

Eu estava sentado no sofá do meu apartamento lendo um livro, de repente, uma daquelas linhas me lembrou de Bruno. A frase em si não tinha a menor relação com ele, não me lembrava ele de forma nenhuma, mas me remeteu de alguma forma ao nosso relacionamento. Fazia um ano que não nos falávamos. Nada, absolutamente nada, nem uma mensagem de texto. Não pensava no assunto fazia mais ou menos dez meses e aquele pensamento soou estranho. Eu ri sozinho em casa. Lembrei de quando ele olhava pra mim e dizia: “Léo, você é o amor da minha vida”, ou então quando ele dizia “Eu nunca vou te deixar, Léo”. Aquilo me incomodou. Não estava com raiva, eu simplesmente estava incomodado com aquilo.

Abri a primeira gaveta da minha escrivaninha onde guardava um calhamaço de folhas brancas, peguei uma caneta qualquer no copo que figurava como porta-treco em cima da mesma escrivaninha e a testei fazendo um risco na primeira folha, a caneta funcionava. Precisava escrever. Comecei mais ou menos assim:

Queria dizer que a seca foi a pior parte, quando olhei para as flores que nós fizemos crescer juntos e elas haviam morrido de sede. Não havia água para elas, assim como não havia água para mim. Você dizia as palavras mais lindas do mundo mas, no fundo, não queria dizer nenhuma delas. Foram meses de idas e vindas e nós ali... Quando percebi que havia perdido a guerra, coloquei minha cabeça no lugar foi quando os céus escureceram na tempestade mais perfeita que já havia visto.


Parei um instante e li o que já havia escrito temendo estar sendo muito dramático, mas cheguei a conclusão que aquilo não importava mais. Eu ser dramático ou não, era apenas uma questão de colocar aquilo tudo pra fora de mim. Deixar tudo sair para que mais nenhuma linha de nenhum livro me remetesse a ele. Meu telefone tocou, era Andréia.

-Diga, Dé... – disse eu sorrindo por ouvir uma voz amiga do outro lado.

-Tá fazendo o que, Léo? Quer ir tomar uma cerveja? Tá quente.

-Pode ser mais tarde? To meio ocupado agora...

-Mais tarde que horas, gato?

-Não sei, eu te ligo. Pode ser?

-Tá tudo bem?

-Tá tudo bem sim, Dé. Não se preocupa não. Eu te ligo. Beijos.

Desliguei sem esperar por uma resposta, sabia que ela me respeitaria, além do mais, não era algo que eu queria compartilhar naquele momento. Andréia certamente diria para eu esquecer, para não escrever aquilo. Eu não sabia nem se ia mandar, então por que dizer? Reli o que tinha escrito e continuei no mesmo parágrafo:

A chuva começou a cair forte de mais, começou a alagar tudo em volta de mim, foi quando eu estava me afogando que consegui respirar e agora faz sol lá fora, já amanheceu. Não há mais qualquer pista de você, Bruno. Talvez você esteja se perguntando, então, por quais motivos estou escrevendo isso: porque preciso te tirar do meu sistema completamente, preciso ficar limpo. Preciso deixar que a correnteza leve tudo de você, todas as nossas fotos, todas as nossas lembranças, absolutamente tudo que nos fez como fomos. Foi quando a água encheu meus pulmões que eu gritei, mas ninguém ouviu nada. Eu estava sozinho e somente sozinho eu poderia superar todo o dano que você me causou.

Respirei de novo, senti realmente como se água estivesse entrando em meus pulmões, olhei pela janela, o sol estava começando a se por e o céu estava alaranjado, parecia que estava pegando fogo. Não havia chuva, não havia uma única nuvem carregada no céu. Sorri. Retomei a carta:

Faz dez meses que não pensava em você, mas devo admitir que não é só porque estou limpo, livre de você que não sinto falta de algumas coisas, acabo sentindo. Sinto falta dos momentos bons que tivemos no começo, mas não me machuca mais, não me faz nada. É apenas uma saudade boa. Bruno, acho que estou finalmente limpo.


Terminei. Não tinha mais o que dizer. Dobrei a carta, olhei de novo pela janela e percebi que o tempo havia mudado. Algumas nuvens haviam surgido e estava chovendo um pouco forte, fui até a sacada e respirei aquele ar molhado, senti um cheiro gostoso de terra molhada que me lembrou muito a infância no interior, quando tomava banho de chuva com minha irmã e meus primos. Nada, absolutamente nada poderia me derrubar de novo da maneira que Bruno havia me derrubado. Acho que essa é a parte boa de passar por essas coisas, por esses traumas. A gente acaba ficando calejado e quando acontece de novo, nem dói tanto. Sorri outra vez, rasguei a carta e a joguei pela janela... Vi os pedaços se dissolvendo na chuva que ficava mais pesada. Eu estava realmente limpo.

Voltei pra dentro do apartamento um pouco molhado, peguei o telefone e liguei para Andréia. Ela atendeu logo depois.

-Agora tá chovendo, bonito.

-Eu te pego de carro e vamos jantar, que tal?

-Por mim tá ótimo, ainda mais se você pagar.



-Hoje é por minha conta. – sorri e fui buscar minha amiga. Aquela noite conversamos e rimos o tempo todo, em nenhum momento me lembrei de Bruno.






English:
To those who made me soil, I’ve gone through the rain and now I am sun.

I was sit on my apartment’s coach reading a book, suddenly one of those lines remembered me of Bruno. A sentence itself didn’t have any relation to him, didn’t remind me of him on any sense, but threw me back, somehow, to our relationship. We haven’t spoke in a year. Absolutely nothing, not even a text. I didn’t think about it for about ten months and that thought sounded weird. I laughed on my own at home. Remembered when he used to look at me and say: “Leo, you are the love of my life” ou when he used to whisper “I’ll never leave you, Leo”. That bothered me. I wasn’t angry, I was simply bothered about that.

I opened up the first drawer on my desk where I used to keep some white papers, took a pen on the glass on the table and tested it making a scribble, it was working. I had to write. Started off with something like this:

I just wanted to tell you that the drought was the very worst part, when I looked to the flowers that we’d grown together died of thirst. There was no water for them as there was no water for me either. You used to say the most beautiful words on the world but, deep inside, you didn’t mean any of them. It was months and months of back-and-forth and we standing there… Hung my head as I lost the war, as the sky turned black like a perfect storm, the most perfect storm I had ever seen.

I stopped writing for a moment and red all that I’d written so far, fearing being too dramatic on my words, but I got to the conclusion that it didn’t matter anymore. Me being dramatic or not, was just a question of putting all of that out of my system. Let it all out so that no other book’s line could take me back to him. My phone ringed, was Andrea:

“Hey, D…” I said smiling for hearing a friendly voice.
“What are you doing, Leo? Want to go grab a beer? It’s really hot”
“Can we go later? I’m kind of busy right now…”
“Later what time, handsome?”
“I don’t know. I’ll call you. Ok?”
“Is everything alright?”
“Yes, everything is fine, D. Don’t worry. I’ll call you. See ya”

I turned it off not waiting for an answer, I knew she would respect me, besides, it wasn’t a feeling that I wanted to share. Andrea would certainly say that I should forget, to not write that, burn that. I didn’t even know if I was going to send it, so why tell her? I red that again and kept on the same paragraph:

Rain came pouring down, everything around me was submerging, when I was drowning, that’s when I could finally breathe and now is sunny out there, it has passed the dawn. There’s any trace of you, Bruno. Maybe you are wondering why I am writing this: because I need to get you out of my system, I need to be clean. I need to let the flood carry away all the memories of you, all my pictures of you, the pictures that made us who we were. The water filled my lungs, I screamed so loud but no one heard a thing. I was alone and only alone I could overcome all the harm you made me.

I took a deep breath and felt like the water was really filling my lungs, I looked out of the window, the sun was setting and the sky was on a burning orange. There was no rain, there was not a single cloud on the sky. I smiled. Went back to the letter:

Ten months I didn’t think of you, I must admit: just because you’re clean, doesn’t mean you don’t miss it, at least a few things. I miss the good moments we had when we started it, it doesn’t hurt me anymore, doesn’t make any scratch. It’s just a good nostalgic feeling. Bruno, I think I’m finally clean.

Finished. There was nothing more to say. I bent the letter and looked out of the window again, I realized the weather had suddenly changed. Some clouds had appeared and it was raining a little, I went to the balcony and took a breath of that wet air, I sensed a nice smell that reminded me of my childhood on the countryside when I used to play under the rain with my cousins. Nothing, absolutely nothing could take me down again the way Bruno did. I think that’s the good part about going through this kind of things, these traumas. We end up stronger and when it happens again it doesn’t hurt so much. I smiled one last time and ripped the letter and threw it out… I saw the pieces melting on the rain that was getting heavier. I was finally clean.
I went back inside a little wet, took my phone and called Andrea. She picked up at once.

"Now is pouring rain, handsome".
"I’ll pick you up with the car and we go to dinner, how about it?"
"Fine by me, finer if you pay it".


"Today is on me" I smiled and went to pick up my friend. That night we talked and laughed all the time, there was no space for Bruno in my mind anymore. 

terça-feira, 23 de junho de 2015

"Style"




Parte do "The Taylor Swift, 1989 Project: Love Stories"
        
   Àquela bela noite quando pensei que o mundo era só aquilo e que o sonho não terminaria. 


Eu estava terminando de me arrumar, sentia borboletas em meu estômago, já havia feito e refeito meu cabelo umas trinta vezes e ainda não me sentia satisfeita. Aquele batom meio rosa me incomodava um pouco, então troquei pelo vermelho clássico e coloquei um vestido que ficava meio justo em mim. Meu relógio de pulso dourado que ganhara de minha mãe em meu aniversário de dezoito anos marcava três para meia-noite e ele havia marcado de me pegar às nove, senti o estômago revirar dentro de mim. Chequei pela última vez o espelho, tomei um copo de água para tentar me acalmar e disse para mim mesma: “Silvia, relaxe... Ele não está tão atrasado”. Quando engoli o último gole de água aquilo me caiu como se fosse uma pedra de gelo: eu era uma completa idiota por insistir naquilo. O relógio deu meia-noite e meu celular tocou, olhei na tela e vi seu nome, atendi:

-Oi... – disse da forma mais seca que pude.

-Desculpa, gata... Eu acabei me enrolando no trabalho. Será que a gente ainda pode fazer algo? – a voz dele realmente parecia ter um certo tom de arrependimento, senti as borboletas voando de novo dentro de mim, minha cabeça pensou em dizer um sonoro não, mas minha boca resolveu tomar a direção contrária. Sabia que eu deveria mandá-lo embora, mas eu simplesmente não conseguia.

-Sim... Em quanto tempo você chega?

-Estou aqui embaixo te esperando, é só descer. – senti a voz dele sorrindo, eu sorri automaticamente.

-Estou descendo! – desliguei sem esperar resposta.

Quando cheguei à portaria do prédio ele estava parado com seu velho Mustang, sorrindo da direção, usava aquele cabelo comprido penteado para trás e a camiseta branca e a jaqueta de couro por sobre ela. Aquele olhar meio James Dean ultrapassou todas as fibras e nervos do meu corpo e me atingiram direto no coração causando um efeito que ninguém mais causava: o sorriso tão sincero quanto o de uma criança. Entrei no banco do passageiro, provavelmente ainda estava sorrindo, porque assim que fechei a porta ele me olhou sorrindo também, me beijou e eu senti aquele gosto doce que só ele tinha. Ninguém mais tinha, olhei para ele por um segundo depois do beijo, a luz fraca dos postes na rua banhavam o rosto dele e eu quis que o mundo parasse naquele mesmo instante.




-Tenho uma proposta... – disse ele com um sorriso de canto.

-Proposta? Você é meio doido... Que proposta? – eu estava realmente curiosa.

-Vamos dirigir sem rumo? Pra qualquer lugar... Qualquer um. – A proposta me pareceu tentadora. O pensamento de estar com Dan em qualquer lugar do mundo, apenas nós dois, era algo que fazia meu coração palpitar.

-Você que está dirigindo. – essa foi minha resposta, ele pareceu entender.

Começou a dirigir, logo estávamos saindo da cidade, na estrada as luzes das estrelas, da lua e do farol do carro eram as únicas coisas que iluminavam, além dos olhos de Dan.

-Você ficou muito brava comigo? – perguntou ele.

-Você poderia ter avisado... – sim, eu havia ficado muito brava com ele.

-Desculpa... Eu fiquei preso na reunião, a bateria do celular acabou. Fui correndo pra casa me arrumar e vim te buscar direto. Só te liguei quando estava na sua casa pra você ficar com dó de mim e não se recusar a descer! – ele riu, eu ri junto.

-Você simplesmente não presta, Daniel. Eu ouvi dizer que você estava por aí com outra garota...

-Sabe... O que você ouviu por aí é verdade. Mas eu não consigo parar de pensar em você.

-Eu sei do que você está falando, eu passei por isso algumas vezes. – eu fiquei vermelha.

-É que eu te amo.

Meu estômago congelou. Ele simplesmente congelou, eu devo ter demonstrado minha surpresa ao ouvir aquilo. Acho que não falei por algum tempo.

-Eu falei algo muito errado? – ele parecia estar assustado.

-Não! Eu só estou surpresa!

-Surpresa boa ou surpresa má? – ele forçou um riso.

-Boa! Muito boa! Eu... Eu te amo também!

-Ah! Ainda bem! Que alívio.

Ele continuou dirigindo, nós passávamos por várias cidadezinhas, nada importava realmente. Ele não conseguia deixar os olhos na estrada e ficava olhando pra mim o tempo inteiro.

-Sabe o que eu acho da gente? – perguntou Dan.

-O que?

-Acho que nós somos aquele tipo de namorados que não saem de moda nunca...

-Como assim?

-Você tem tudo que eu gosto, uma vibe meio clássica. Você é perfeita.


-Me leva pra casa? – foi só o que eu consegui dizer naquele momento, eu queria estar sozinha no meu quarto com ele. Só nós dois e os lençóis pelo resto da noite. Ele ficou me olhando, quando entendeu sorriu e pegou o primeiro retorno que encontrou, acelerou mais do que devia. Eu não queria saber se ele estava com outra garota, naquele momento só existíamos nós dois, apenas nós dois e ninguém mais. O mundo girava mais devagar enquanto eu tremia de prazer, tudo aquilo parecia completamente irreal para mim. Eu não me preocupei, não me preocupei porque sabia que nós sempre vamos nos machucar e depois vamos voltar um para o outro, acho que talvez seja aquele olhar de James Dean que me faz sonhar acordada, ou o meu batom vermelho, talvez sejam os cabelos dele penteados pra trás e a sua camiseta branca, ou a minha fé de boa garota e o meu vestido justo.







English Version:



To that beautiful night where I though the world was that and that the dream wouldn't end.

I was finishing to put on my make up for what it seemed like the tenth time, I felt butterflies on my stomach, my hair had been up and down a thousand times and still I wasn’t satisfied. The pink lipstick bothered me a little, so I changed to the classic red one e dressed up a tight skirt. My golden watch, a gift from my mother on my eighteenth birthday pointed three to midnight. He had told me he was picking me up at nine, I felt my stomach twisting inside of me. Then, I went to check the mirror for the last time, took a sip of water to see if it could calm me down and said to myself: “Silvia, relax… He is not so late”. When I swallowed the rest of the water, that went down like a solid rock of ice inside of me. The watch pointed midnight and my phone ringed, I looked the screen and saw his name:

            “Hi…”, I sad as tough as I could.
“Sorry, babe… I got stuck up at work. Can we still hang out?”, his voice sounded really regretful. Once again I felt the butterflies flying inside of my stomach, my had told me to say a loud no, but my mouth took the opposite direction. I should have told him to leave, I knew exactly where it was going to lead, but I decided to watch us go ‘round again.
“Yes… how long will you be here?”
“I’m downstairs waiting for you, just come down”, I felt his voice smiling, I smiled at once.
“I’m coming!”, I turned the phone off without waiting for the answer.

When I got to the building’s entrance, he was standing there inside his old Mustang, smiling from the wheel, he got that long hair slicked back, the white t-shirt and a black leather jacket on top of it all. He got that James Dean look in his eyes that went through all of my fibers and nerves that composed my body hitting straight on my heart causing an effect that no one else did: a smile as honest as a child’s. I got in the passenger’s sit, I was probably still smiling because as soon as I shut the door he looked at me smiling as well, he kissed me and I felt that sweet taste which no one else had. No one else but him, I looked at him for a second after the kiss, the low light from the lamps on the street illuminated his face and I wished the world to stop on that very moment.

            “I’ve got a proposal…” he said with a side smile.
“Proposal? You’re kind of crazy… What proposal?” I was really curious.
“Let’s drive to nowhere? Anywhere… No one” the proposal tempted me. The thought of being at anyplace on the world with Dan, just us two, was something that made my heart pound.
“You are the one who’s driving” that was my answer, and I think he understood.

He started to drive and soon we were leaving town, on the road only the lights coming from the moon and the stars and the car’s lights, those were the only things lighting up our way, besides, of course, Dan’s eyes.

           “Are you mad at me?” he asked me sounding a little guilty.
“You could have called me…” yes, I was really mad at him.
“I’m sorry… I was stuck at a meeting, my phone’s battery died. I went straight home to dress up and came to pick you up. I just called when I was at your place so you could be sorry for me and accept to come down!” he laughed, I laughed along with him.
“You are not worth it, Daniel. I hear you’ve been out and about with some other girl…”
“You know… what you heard is true, but I can’t stop thinking about you”
“I know what you’re talking about, I’ve been there too a few times” and I blushed.
“I love you” he said smoothly. 

My stomach froze. It just froze upon those words, I must’ve shown my surprise hearing to that. I think I didn’t say anything for a while, 'cause he just went back on speaking:

           “Did I say something wrong?” he seemed scared.
“No! I’m just surprised!”
“A good surprised or a bad surprised?” he forced a laugh.
“A good surprised! A very good! I… I love you too!”
“Oh! Great! That’s a relief!”

He kept on driving, we were going by some little towns on the side of the dark road, nothing else mattered. He couldn’t keep his wild eyes on the road and kept looking at me all the time.

            “Do you know what I think about us?” Dan asked.
“What?”
“I think we are that kind of lovers that never go out of style…”
“What do you mean?”
“You have everything I like, like a classic vibe. You’re perfect” I looked at him more in love than ever and said:
“Take me home?”

That was all I could say that moment, I wanted to be alone on my room with him. Just the both of us and the sheets for the rest of the night. He looked at me, understood what I meant and took the first way back he found, speeded up more than he could. I didn’t want to know if he had been with some other girl, on that moment there were only us, the lights out, he was taking off his coat, just us and no one else. The world was spinning slower while I shivered as he kissed my body, all of that seemed completely unreal to me. I wasn’t worried, I wasn’t worried because I knew we were always going to crash down and come back every time, I think that maybe it was his James Dean daydream look in his eyes, or my red classic lipstick, maybe it was his long hair slicked back and his white t-shirt or even my good girl faith and my tight little skirt.